Loomio
KBP

Kristian Brito Pasini Tue 31 Mar 2015 6:00AM

Deve o racismo, por exemplo, deixar de ser especificamente criminalizado, por essa lógica? E a Lei Maria da Penha?

Assunto difícil.

G

galdino Tue 31 Mar 2015 6:46AM

coloquei a discussão de forma um pouco mais elaborada no grupo sudeste: https://www.loomio.org/d/Exn3QWwP/sociedades-piratas-sem-prisoes-discussao-sobre-abolicao-do-sistema-prisional

seguindo a lógica abolicionista, sim, todas as condutas opressoras deveriam deixar de ser criminalizadas junto com qualquer outra conduta considerada crime em prol de outro paradigma tomado como base para ações voltadas à redução de violência e de condutas prejudiciais à sociedade (seguindo, claro, aquele mesmo raciocínio que empregamos ao falar de democracia plena em nosso programa -- mudanças radicais como condição para a "utopia")

por outro lado, acho possível e inclusive recomendável que um partido ou movimento político de qualquer natureza abandone pedidos de aumento do sistema penal atual e de mais criminalização e foque em outras abordagens para os problemas, sem se comprometer explicitamente com o abolicionismo do sistema prisional e fim do sistema penal como condições para existência de uma sociedade ideal sem opressões e violência estrutural.

G

galdino Tue 31 Mar 2015 6:50AM

tomando o caso apenas do partido pirata, poderíamos pensar assim: não falta quem defenda a ampliação do sistema penal capitalista (até mesmo na esquerda anticapitalista brasileira), então por que não podemos deixar isso de lado e pensar soluções de outra ordem, ao mesmo tempo em que condenamos as opressões direcionadas às minorias e lutamos para diminuir as mesmas pela via do empoderamento? nós que chegamos depois ainda podemos fazer bem diferente.

G

galdino Tue 31 Mar 2015 7:46AM

uma questão fundamental que temos de nos colocar no que diz respeito a pautas que defendem criminalização é a seguinte: se temos problemas sérios com nosso atual sistema prisional, se temos problemas com a seletividade extrema de uma justiça comprometida com os interesses das elites que têm acesso privilegiado ao aparato estatal, se temos problemas com a atuação de agentes da repressão (policiais, juízes, agentes penitenciários), entre outras coisas, por que diabos defendemos criminalização de certas condutas sob tais condições? não seria muito mais coerente que ao menos pedíssemos essa criminalização sob a condição de que só deveria ser realizada em uma sociedade profundamente diferente da que temos hoje (a saber, a sociedade que nós mesmos defendemos em nosso programa)? faz algum sentido convocar a ação do aparato estatal em uma de suas piores formas quando condenamos uma conduta, sabendo que essa ação será repleta de todo tipo de abusos e violências que também condenamos em geral? obviamente sentimos um incômodo profundo quando vemos que certas condutas em nada prejudiciais para nossa sociedade são criminalizadas enquanto outras que têm a forma de opressão direcionada a setores da sociedade já oprimidos de diversas maneiras não são, mas a solução é democratizar a violência do estado? não deveria uma organização política pensar alternativas sem perder de vista que existem condutas que oprimem minorias e que devem desaparecer para que tenhamos o mínimo de dignidade em uma sociedade?

KS

Kaiser Schwarcz Tue 31 Mar 2015 10:08AM

Penso que o caminho para extingüir os problemas de intolerância e preconceito com a diversidade (sexual, de gênero, racial, religiosa, etc) seja a educação.
Precisamos defender que as escolas promovam um educação inclusiva, que não transmita conceitos pré-concebidos de superioridade de determinado comportamento ou característica, que não subentenda em suas atividades a divisão de tarefas com base no gênero ou outras características físicas. Que os temas de igualdade sejam tratados desde o início da vida escolar dos alunos.
Mas só isso não basta. É preciso que os professores também sejam reeducados neste sentido e todo o restante da sociedade também.
Infelizmente o atual governo não levou adiante o projeto "Escola Sem Homofobia". Até mesmo as campanhas contra AIDS foram em parte abandonadas. Mas penso que o caminho seria esse; educar as crianças através das escolas e rreducar adultos com campanhas na tv, nos jornais, nos locais de trabalho, eté durante jogos de futebol enfim, onde as pessoas estiverem.
Dito isso, ainda assim sou contra defender o fim do sistema penal. Defendo a educação como caminho principal, mas se a agressão física ou moral for cometida, deve sim ser punida criminalmente ainda que ao mesmo tempo defendamos a mudança do sistema penal e penitenciário. Acho que o sistema deve optar por penas em regime aberto sempre que possível, mas não vejo como um cara que efetivamente espancou um travesti até a morte possa ser deixado em liberdade.

KS

Kaiser Schwarcz Tue 31 Mar 2015 10:13AM

Com relação ao que o Galdino comentou no outro tópico (será que o problema mais fundamental de nossa sociedade não é justamente a existência de leis que podem determinar o que é crime ou não? quais setores da sociedade brasileira são beneficiados pelas leis? para quem serve o código penal? tomando agora o fato de que apontamos para um paradigma distinto para se pensar a questão da segurança - algo que segue a linha de raciocínio de quem defende o paradigma da necessidade: “Em uma sociedade empoderada, as pessoas não precisam de leis escritas; elas têm o poder de determinar se alguém as impede de satisfazer suas necessidades e podem convocar seus pares para que as ajudem a resolver os conflitos. )

Discordo dele. As leis penais são importantes para estabelecer o que é ou não aceito pela sociedade. Acho que o código penal deve ser reformado (ou revolucionado) em um processo de democracia direta, com sua elaboração e aprovação feitas pelo conjunto da sociedade mas ainda deve existir.
A inexistência de um código penal criaria uma enorma insegurança social em que ninguém saberia o que é ou não crime e estaria sujeito a ser punido por qualquer ató que cometesse. Penso que seria uma situação ainda pior que a atual, um terror generalizada como na época do regime revolucionário francês.

B

Barney Tue 31 Mar 2015 1:29PM

@victorgaldino te recomendo o seguinte artigo, "A esquerda punitiva", considerado paradigmático http://emporiododireito.com.br/a-esquerda-punitiva-por-maria-lucia-karam/

Acho que a criminalização da homofobia entra bem nesse tema. A esquerda desistiu de lutar contra o sistema penal e apenas tenta mira-lo para seus inimigos, sem maior reflexão

B

Barney Tue 31 Mar 2015 1:30PM

o Fidelix foi multado em 1 milhão de reais por declarações homofobicas, o qmostra que a conduta não precisa ser crime para a combatermos

G

galdino Tue 31 Mar 2015 4:48PM

@paulomartinsdacost esse exemplo do fidelix é ótimo, acho que é uma das alternativas que podemos defender.

vou ler o texto sim, se tiver mais material pode passar

G

galdino Tue 31 Mar 2015 4:51PM

@kaiserschwarcz
"A inexistência de um código penal criaria uma enorma insegurança social em que ninguém saberia o que é ou não crime e estaria sujeito a ser punido por qualquer ató que cometesse"

isso não tem sentido nenhum quando a questão é mudança de paradigma crime-castigo para um paradigma da necessidade, infinitamente mais apropriado e coerente para sociedades nas quais uma democracia plena exercida por pessoas radicalmente empoderada está em questão. regras para uma sociedade não têm nada a ver com código penal. em nenhuma sociedade sem leis determinadas sob a forma de código penal existe esse problema que você apontou. aliás, esse medo do terror é só parte de uma educação capitalista que recebemos.

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